A VIDA DE UMA RAINHA SANTA QUE NUNCA FOI SANTA NEM RAINHA

O Museu de Arte Sacra ocupa o espaço que era dos dormitórios das monjas. 
Aproveitamos o encontro com esta estátua em tamanho real em relação à representada e,   esculpida num único bloco de madeira, para apresentar aquela que foi a figura mais importante deste Mosteiro e de Arouca, a "nossa mui amada Rainha Santa Mafalda". Foi assim que o guia a apresentou.
Nasceu no meio de uma prole de onze irmãos, todos personalidades importantes. 
O nome Mafalda vem da avó, Sanches vem do pai Sancho porque, naquele tempo, o sufixo "es" indicava "filho/a de".
 Filha de D Sancho I de Portugal e de D. Dulce de Aragão, assim se fez Mafalda Sanches de Portugal.
Foi criada por uma aia, Senhora de posses, que lhe deu uma educação religiosa e lhe deixou terrenos em herança que, juntamente com os que seu pai lhe doou, a transformaram em  proprietária importante e poderosa na zona de Arouca.
Preocupado com o perigo que o poder das irmãs poderia representar para o seu reinado, D. Afonso II encarregou-se de as casar cedo com pretendentes a outros tronos. Cada uma delas, ao casar, sairia de Portugal deixando para trás terrenos e títulos.
A Dona Mafalda calhou casar aos treze anos com o seu primo Henrique I de Castela de apenas dez anos. 
E para lá foi. E lá se casou. E lá haveria de ficar até que a Idade permitisse que fossem entronados e que o casamento pudesse ser consumado.
Nessa época era regente em Castela uma tal de Berengária, irmã mais velha de Henrique, que não achou muito próprio que fosse uma portuguesa a suceder-lhe caso algo acontecesse ao seu irmão e logo tratou de procurar motivos válidos para anular o casamento. E encontrou!
Afonso II, querendo casar sua irmã com um primo, estava obrigado a pedir uma autorização especial de consanguinidade ao Papa, coisa que não fez.
Assim, o casamento de Henrique e Mafalda foi anulado um ano depois de ter sido celebrado, para grande gosto de Berengária. 
Meses depois da anulação Papal do casamento Henrique foi atingido na cabeça por uma telha que se desprendeu da torre do castelo enquanto brincava com outras crianças no páteo e acabou por morrer.
Muito previdente a mana Berengária!

Santa Mafalda - Museu de Arte Sacra - Arouca - PORTUGAL


Acabada de chegar de Castela, D. Mafalda apercebeu-se que, para além de um marido, uma coroa e um reino, tinha perdido também os territórios que lhe calharam em testamento por parte de seu pai e sua aia. Uma cortesia de seu irmão, o Rei Do. Afonso II que considerava nefasto para a unidade do reino o poder que as irmãs tinham sobre os territórios que lhes tinham calhado em testamento.
Sem marido, sem coroa, sem reino e sem o território que tinha sido seu por direito, Dona Mafalda não se conformou. Com a ajuda de alguns nobres, encetou uma contenda com seu irmão pela posse do território.
D. Afonso II morreu e a contenda não ficou resolvida.
Foi seu sobrinho, o Rei D. Sancho II, que conseguiu chegar a um acordo: devolveria às tias soberania sobre os territórios que lhes eram devidos, desde que estas abdicassem do título de rainha.
Sem marido, sem coroa, sem reino e agora sem regência possível, mas com a sua soberania sobre os terrenos de Arouca recuperada, recolheu-se ao Mosteiro de Arouca. Com uma educação religiosa e um casamento não consumado, não havia motivo para que assim não fosse.
Não fez noviciado, nunca professou, mas a sua chegada ao Mosteiro trouxe grandes mudanças.

Museu de Arte Sacra - Mosteiro de Santa Maria - Arouca - PORTUGAL

Mesmo sem nunca ter sido monja ou Abadessa, Dona Mafalda ocupou a sua vida na administração deste Mosteiro bem como do Mosteiro de Rio Tinto e ainda conseguiu fundos para o restauro e construção de templos religiosos.
Eram frequentes as suas deslocações entre Arouca e Rio Tinto e, numa dessas deslocações, veio a falecer,
no dia 1 de Maio de 1256, aos 61 anos, muito para além da esperança de vida do seu tempo.
Deixou escrito que queria ficar sepultada no Mosteiro de Arouca, vestida como uma rainha e com coroa e ceptro.
Fez-se um cortejo fúnebre de Rio Tinto até Arouca e foi sepultada em urna de granito na igreja do Mosteiro.
Já muito mais tarde, no século XVII, por ocasião das obras de recuperação na igreja, foi necessário proceder à abertura do túmulo e, para surpresa de todos, o corpo encontrava-se incorrupto.

Túmulo de Santa Mafalda - Igreja do Mosteiro de Arouca - PORTUGAL

Para que se pudesse testemunhar da integridade do corpo de Dona Mafalda tantos séculos após a sua morte, foram feitos alguns trabalhos de conservação a cera no rosto e foi colocada numa urna de vidro, à vista de todos, num dos altares laterais da igreja do seu Mosteiro de Arouca, vestida de rainha com coroa e ceptro, tal como era de sua vontade.
Por uma vida dedicada à religião, por ter contribuído de forma significativa para a recuperação e construção de templos religiosos e até talvez por relatos de alguns milagres que os mais devotos lhe foram atribuindo, foi beatificada no ano de 1793. Ficou conhecida para a Igreja como Beata Mafalda de Portugal.
Foi a população de Arouca que a colocou até hoje no lugar que sempre achou ser seu por direito: "Nossa Mui Amada Rainha Santa Mafalda".

Túmulo de Santa Mafalda - Igreja do Mosteiro de Arouca - PORTUGAL

















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